segunda-feira, 6 de junho de 2011

O Carteiro e o Poeta

Leitura do Filme:

O Carteiro e o Poeta sob o enfoque do texto: O que é Leitura[i]

Otacílio Gomes da Silva Neto


As lágrimas que não se choram
acumulam-se nos lagos?
Ou serão rios invisíveis
que escorrem até as tristezas?
(Neruda)

Uma viagem rumo ao conhecimento. O filme: O Carteiro e o Poeta é uma dessas produções cinematográficas que nos fazem pensar sobre nós mesmos, sobre a nossa relação com o mundo e com as pessoas com as quais convivemos. Entendemos por conhecimento não apenas aquelas discussões frias que acalentaram os modernos envolvendo racionalismo e empirismo, mas, conhecimento como algo vivo, rico de sentido e de significado. O filme nos inspira a re-descobrir o mundo, pois a experiência do eu-no-mundo não é algo vazio, insosso, que nos empurra inexoravelmente para um impulso de mediocridade. Não é sem razão que Heidegger[ii] nos escreve que:


No poetar do poeta, como no pensar do filósofo de tal sorte se instaura um mundo, que qualquer coisa, seja uma árvore, uma montanha, uma casa, o chilrear de um pássaro, perde toda monotonia e vulgaridade (HEIDEGGER, 1978, p.55).

Ambientado em uma pequena, mas belíssima Ilha italiana (Carla di Sotto) em meados da primeira metade da década de 70, o filme conta a história de uma amizade entre um carteiro desiludido chamado Mario Ruoppolo e o imortal poeta chileno Pablo Neruda, proscrito do Chile pela ditadura militar. A presença de Neruda desperta dois sentimentos entre as pessoas quais sejam o engajamento social por ser considerado um comunista: poeta do povo, e a simpatia das mulheres pela sua poesia marcadamente sensual: poeta do amor. É nessa tensão entre amor e engajamento social que o filme mantém o seu coerente roteiro.
Ao ser escolhido para ser carteiro da Ilha em que a grandíssima maioria das pessoas é analfabeta, Mario é destinado exclusivamente para atender às correspondências de Neruda. Esse fato unido ao problema da carência do abastecimento d’água e da exploração dos pescadores infere no espectador um sentimento de exploração às quais as pessoas da Ilha estavam condenadas. É nesse contexto de desilusão que Mario é despertado para a vida quando por iniciativa própria começa a ler os livros de Neruda. Isso corrobora com Kleiman[iii] quando ela afirma que: A linguagem já foi caracterizada como “o instrumento mais eficiente para interferir na vida dos outros” (KLEIMAN, 1995, p.65).
O contato com o texto permite a Mario despertar-se para o mundo. Há uma estreita relação entre texto e leitor. O mundo de Neruda não era tão distante do de Mario, em ambos havia exploração entre seres humanos, bem como belas mulheres loucas para serem amadas. Há um momento no filme que ilustra bem esse momento. Mario está a ler numa taberna enquanto um político de nome Di Cosimo engana e explora os populares da Ilha. A poesia de Neruda se encaixa quase que perfeitamente ao momento em que Mario está vivenciando:

... acontece que vou ao cinema e ao alfaite
se sentindo caindo dormente, como um cisne perdido
navegando num mar de fracassos e causas.
O cheiro de uma barbearia
me faz soluçar em voz alta
Estou cansado de ser homem...

A presença de Neruda e de seus livros desperta em Mario a curiosidade pelas letras. Os versos como esse último, afloram os sentimentos do Carteiro. Do conhecimento de mundo, Mario viaja ao textual. É nele que há a interação entre leitor e texto. Conforme Kleiman:

Os textos também podem ser classificados levando-se em consideração o caráter da interação entre autor e leitor, pois o autor se propõe a fazer algo, e quando essa intenção está materialmente presente no texto, através das marcas formais, o leitor se dispõe a escutar, momentaneamente, o autor, para depois aceitar, julgar, rejeitar (KLEIMAN, 1995, p.19).

As palavras de Neruda são absolvidas por Mario, porque de alguma maneira elas lhes inspiram um profundo sentido. Está aberto o caminho para o conhecimento lingüístico. Ele se dá no filme quando o Carteiro consegue falar metaforicamente sem conhecer sequer a palavra metáfora. Entusiasmado diante da palavra proferida por Neruda, Mario pergunta: o que são Metáforas? Nesse momento o conhecimento textual empurra o Carteiro para o conhecimento lingüístico: Metáfora é quando se fala de uma coisa comparando-a com outra, responde o poeta. Mario consegue associar de forma processual as palavras Metáfora e o modo de ser da Metáfora, ou melhor, ele consegue associar o nome ao seu significado.
Outro aspecto interessante é que Mario quer ser poeta para conquistar mulheres. Mas, como se é poeta? Lógico que não é uma atividade meramente racional. Ninguém melhor do que Neruda para explicar. Não dá para ser poeta sem contemplar o mundo a sua volta. A leitura primitiva é a sensorial: A visão, o tato, a audição, o olfato e o gosto podem ser apontados como os referenciais mais elementares do ato de ler (MARTINS, 2007, p.40). A partir dessa experiência, as coisas podem começar a ganhar um novo sentido, pois: Certamente aprendemos a ler a partir do nosso contexto pessoal. E temos que valorizá-lo para poder ir além dele (MARTINS, 2007, p.15).
A princípio, não é preciso racionalizar as imagens, pois elas nascem espontaneamente. É desse modo que podemos fazer metáforas, sem necessariamente pensar em fazê-las. A força dos sentidos é forte, não dá para simplesmente sermos indiferentes a elas. Podemos dizer que o emocional e o racional são conseqüências do sensorial. Primeiro vemos, depois sentimos e pensamos. Claro que tudo isso às vezes numa fração de segundo. Observemos essa frase do roteiro sobre a poesia: Quando você a explica, a poesia se torna banal. Melhor do que qualquer explicação é a experiência de sentimentos que a poesia pode revelar a uma alma suficientemente aberta para entendê-la.
Observemos que Neruda enfatiza o emocional, a experiência dos sentimentos, para podermos sentir prazer e emoções na leitura poética. As letras não são meros resultados de silogismos racionais. O sensorial e o emocional podem ter uma força inimaginável. Nesse nível tudo é possível.
Por outro lado, as palavras de Neruda são paradoxais, pois nada mais racional do que essa crítica à razão em defesa do sentimento. Às vezes razão e emoção estão tão unidas que numa primeira vista não conseguimos identificá-las. Conforme Martins:

... a leitura racional acrescenta à sensorial e à emocional o fato de estabelecer uma ponte entre o leitor e o conhecimento, a reflexão, a reordenação do mundo objetivo, possibilitando-lhe, no ato de ler, atribuir significado ao texto e questionar tanto a própria individualidade como o universo das relações sociais (MARTINS, 2007, p.66).

          A poesia de Neruda não é parnasiana. Não obedece a frias junções de palavras mornas. O filme mostra que Neruda tem uma poesia viva, é essa vivacidade que desperta o amor e o engajamento em pessoas simples como Mario, o Carteiro, que pode até levá-las ao martírio. Neruda vê, sente e escreve. O resultado é o que a racionalidade lhe atribui: poesia engajada, poesia lasciva. A poesia não pertence a quem escreve mas àqueles que precisam dela.



[i] MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. São Paulo: Brasiliense, 2007.
[ii]HEIDEGGER, Martin. Introdução à metafísica. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1978.
[iii] KLEIMAN, Angela. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. São Paulo: Pontes, 1995.

sexta-feira, 27 de maio de 2011



PARIS EM 1968
Poesia na rua era um dos grafites da Paris 1968.
Poesia na rua nos inspira a pensar em novas e diferentes formas de agir e pensar.
Poesia na rua é um pensamento livre.
Poesia na rua: torna "a vida um exercício apaixonado de uma busca"(Luzilá Gonçalves).
Poesia na rua é desejo, paixão, inquietação, filosofia.
Poesia na rua sou eu, você, todos nós.





We hope that poetry in the streets will
Inspire people to think and act in new and different ways.
Poetry in the street is a space for free thinking.
Poetry in the streets is about turning life into a search for things that you love.
Peotry in the streets is desires, passions, anxieties and plilosophies.
Peotry in the streets: it’s me, you and all of us together.

Por Otacílio Gomes